A obrigatoriedade da Declaração de Operação de Transporte e do registro do CIOT – Código Identificador da Operação de Transporte, seus reflexos no campo regulatório, no Direito Previdenciário e no Direito Tributário.

Em 17 de janeiro de 2020 iniciou a vigência da Resolução ANTT/DC Nº 5.862, de 17/12/2019, através da qual a Diretoria da Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT, no uso de suas atribuições conferidas pelo inciso II do art. 20 da Lei nº 10.233, de 5 de junho de 2001, e na Lei nº 11.442, de 5 de janeiro de 2007, regulamentou o cadastro da Operação de Transporte necessário para a geração do Código Identificador da Operação de Transporte – CIOT e os meios de pagamentos do valor do frete referentes à prestação de serviços de transporte rodoviário remunerado de cargas.

Conforme definido na resolução em comento, o CIOT é o código numérico obtido por meio do cadastramento da Operação de Transporte em sistemas específicos, disponibilizados por Instituições de Pagamento Eletrônico de Frete – IPEF, previamente habilitadas pela ANTT.

O cadastramento da Operação de Transporte, com subsequente geração e recebimento do CIOT, deve ser gratuito e feito pela internet pelas IPEF´s, as quais poderão disponibilizar outras soluções associadas, sendo facultada, nestes casos, a cobrança.

Para fins de sua aplicação e interpretação, a Resolução ANTT/DC Nº 5.862, de 17/12/2019 prevê que os dispositivos que tratam do cadastramento da Operação de Transporte e correspondente geração do CIOT são aplicáveis a todos os transportadores.

O pagamento do frete ao Transportador Autônomo de Carga – TAC ou ao TAC-equiparado (empresas com até três veículos no RNTRC) será efetuado obrigatoriamente por meio de crédito em conta mantida em instituição integrante do sistema financeiro nacional, inclusive conta poupança e conta de pagamento, ou meios de pagamento eletrônico de frete de IPEF habilitada pela ANTT.

Os meios de pagamento eletrônico de frete consistem em recursos tecnológicos por meio dos quais é possível efetuar créditos para pagamento dos fretes aos contratados, devendo possuir tecnologia que permita a utilização para operações de saque e débito, a individualização do contratado ou subcontratado, quando existir, pelo número do CPF ou CNPJ, e a utilização de senha ou outro meio que impeça o seu uso não autorizado.

DAS INFRAÇÕES ADMINISTRATIVAS E PENALIDADES

Estabelece a Resolução ANTT/DC Nº 5.862, de 17/12/2019, que o descumprimento do estabelecido sujeitará o infrator às penalidades previstas no art. 21 da Lei nº 11.442, de 2007, com valores de multas que iniciam em R$ 550,00, limitando-se a R$ 10.500,00, variáveis de acordo com o tipo de infração e valor do respectivo frete.

REFLEXOS NO CAMPO PREVIDENCIÁRIO

Com a exigência do registro eletrônico da Operação de Transporte, detalhada em relação a origem, destino, natureza da carga, valor líquido do frete, seguro e, em especial, a parcela destinada ao INSS, outros órgãos, dentre os quais a Receita Federal do Brasil, terão maior facilidade para o desenvolvimento de operações de fiscalização contra a sonegação.

Destaque-se que não existe qualquer isenção sobre a retenção de percentuais relativos ao frete contratado a título de contribuição previdenciária.

Atualmente, a base de cálculo para fins de incidência da contribuição previdenciária relativa ao transporte efetuado por TAC corresponde a 20% do valor total recebido pelo TAC a título de frete.

A alíquota mínima da contribuição previdenciária incidente sobre o transporte efetuado pelo TAC é de 11%.

Assim, para um frete cujo valor recebido pelo TAC foi de R$ 1.000,00, a base de cálculo a ser considerada, exclusiva para contribuição previdenciária, é de R$ 200,00, resultando num valor de R$ 22,00 a ser retido pela transportadora e recolhido em favor da Previdência Social.

Destaque-se que os valores retidos pelas transportadoras, em nenhuma hipótese, podem deixar de ser repassados à Previdência Social, sob pena de seus responsáveis legais responderem pela prática dos crimes de Apropriação Indébita Previdenciária e de Sonegação de Contribuição Previdenciária, previstos, respectivamente, nos artigos 167-A e 337-A do Código Penal, cujas pena variam de dois a cinco anos de reclusão e multa, sem prejuízo de eventual responsabilização solidária do contratante do transporte (embarcador ou destinatário), especialmente no campo administrativo/fiscal.

Todas essas exigências não são apenas garantia à arrecadação governamental. Na realidade tratam-se de instrumentos legais destinados à inscrição e manutenção da qualidade de segurado dos caminhoneiros autônomos perante a Previdência Social.

Na prática, a maioria dos caminhoneiros autônomos que não recolhem contribuições previdenciárias acreditam que não estão amparados pela Previdência Social, ou seja, que não teriam qualidade de segurado e, consequentemente, não teriam direito ao auxílio-doença e outros benefícios como as aposentadorias por tempo de contribuição, idade ou invalidez.

Para aqueles trabalhadores que há tempo prestam seus serviços para transportadoras sérias e cooperativas que realizam regularmente os recolhimentos das contribuições relativas aos fretes, é grande a possibilidade de manterem a qualidade de segurado e consequentemente usufruírem de benefícios previdenciários, desde que preenchidos os demais requisitos legais relativos à concessão de cada benefício.

Dada a rotatividade da prestação de serviços pelos caminhoneiros autônimos, alternando para cada local de carga as empresas transportadoras que os contrata, a melhor forma de saber sua situação perante a Previdência Social é através da obtenção do Extrato Previdenciário mediante consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS, disponível através da Central de Serviços Meu INSS, acessível por meio de computador ou celular.

Através do Extrato Previdenciário o TAC poderá verificar sua condição de filiação perante a Previdência Social e, ainda, constatar se os valores que foram retidos de seus fretes pelas transportadoras a título de contribuição previdenciária obrigatória foram regularmente recolhidos à Previdência Social.

Destaque-se que a atual crise de saúde que estamos vivendo é mais um forte motivo para que os caminhoneiros autônomos se preocupem em manter a qualidade de segurado perante a Previdência Social pois, em caso de adoecimento, poderão usufruir do auxílio-doença.

REFLEXOS NO CAMPO TRIBUTÁRIO

Para o pagamento de serviços prestados por profissionais pessoas físicas e que não estejam regidos pelo sistema CLT, em geral utiliza-se o Recibo de Pagamento Autônomo – RPA, considerado documento comprobatório para inúmeras finalidades, permitindo destacar os tributos a serem recolhidos pelo contratante, tais como INSS, IRPF e ISS.

No caso da contratação de TAC a Empresa de Transporte de Cargas – ETC deverá emitir a Declaração de Operação de Transporte e registrar o CIOT, onde serão destacados tributos, tais como INSS, IRPF e SEST/SENAT, além de outros valores a exemplo dos custos com pedágio no trecho compreendido entre a carga e descarga e com seguro da carga.

No caso da contratação de TAC a Declaração de Operação de Transporte é documento indispensável para a contabilidade da transportadora contratante e para o autônomo, pois é dela que serão extraídas as informações a serem declaradas à Receita Federal no momento do ajuste anual.

Assim, ao preencher sua Declaração de Ajuste Anual de Imposto de Renda, o caminhoneiro autônomo deverá buscar as informações sobre sua renda nas Declarações de Operação de Transporte e nunca nos Conhecimentos de Transporte Eletrônico – CTE´s, pois estes indicam os valores pagos pelo embarcador, os quais incluem, além do frete, percentuais que ficam com a transportadora a título de lucro, despesas administrativas e operacionais, além dos custos com seguros, tributos, pedágio, carga, descarga e outros.

Destaque-se que a declaração de ajuste anual baseada nos valores constante nos CTE´s, além de inverídica, elevaria demasiadamente a base de cálculo dos valores recebidos pela pessoa física, exacerbando os valores a serem pagos a título de Imposto de Renda Pessoa Física.

Outro fator importante para a declaração de ajuste anual é a base de cálculo, a qual, diferentemente da base de cálculo da contribuição previdenciária (20%), constitui para o Imposto de Renda Pessoa Física 10% do valor líquido recebido pelo caminhoneiro autônomo constante na Declaração de Operação de Transporte.

Exemplificando:

Valor líquido recebido: R$ 10.000,00

Base de cálculo INSS: R$ 2.000,00

INSS retido/recolhido pelas transportadoras contratantes (11%): 220,00

Base de cálculo IRPF (10%): R$ 1.000,00 – (INSS recolhido e demais despesas dedutíveis).

IRPF a ser pago: variável de acordo com a faixa de rendimento anual (Isento até R$ 1.903,98; 7,5% entre R$ 1.903,99 e R$ 2.826,65; 15% entre R$ 2.826,66 e R$ 3.751,05; 22,5% entre R$ 3.751,06 e R$ 4.664,68; 27,5% acima de R$ 4.664,68).

 

ANTONIO MARCOS BASSANI

Advogado

Abril de 2020